Marc Souza

Agente penitenciário, escritor e Diretor do Sifuspesp
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Por Marc Souza

A classe política nacional decidiu que os funcionários públicos, selecionados por concurso públicos de provas e títulos, são os grandes vilões dos gastos do Estado e a grande causa dos sucessivos prejuízos causados ao erário público.

É interessante que, para a classe política, não são suas próprias benesses e regalias as grandes causadoras de despesas para o Estado. Nem os agentes públicos que, por serem de livre nomeação deles próprios e seus partidos políticos, aparelham o Estado, estando nas diversas áreas do governo para servirem os interesses de quem lhes nomeou e não para protegerem o patrimônio público. Nem os ministros e secretários de Estado, todos de livre nomeação política, tampouco a grande discrepância de salários, principalmente da cúpula dos três poderes que já em início de carreira ganham quase o teto estabelecido.

Políticos brasileiros possuem não só benesses, mas também verdadeiras regalias de causarem inveja em políticos do mundo todo. Para se ter uma ideia, um deputado federal ganha um salário mensal de R$ 33.763,00, mais auxílio moradia de R$ 4.253,00 ou apartamento de graça, verba de gabinete de R$ 111.675,59 para gastar com funcionários, além de valores entre R$ 30.788,66 e R$ 45.612,53 para gastarem com aluguel de veículo, escritório, divulgação de mandato, entre outras despesas, além de ressarcimento com gastos médicos.

Um ministro de Estado, por exemplo, pode chegar a ganhar até R$ 100 mil mensais se contarmos os gastos com carros oficiais, auxílios moradias, alimentação, segurança, assessores e motoristas. E, pasmem, para ser um ministro de Estado a pessoa nem precisa ter curso superior ou qualquer experiência na área que irá desenvolver o seu trabalho. Para exercer, basta ser indicado pelo Presidente da República.

Na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo a realidade não é diferente, segundo reportagem do site de notícias UOL de 19/07/2020. Mesmo no período de pandemia, os deputados estaduais haviam gastado cerca de R$ 7,6 milhões de janeiro a maio com moradia, transporte e serviços de comunicação.

Em 2018 o Congresso Nacional Brasileiro foi considerado o segundo mais caro do mundo, perdendo somente para o Congresso dos Estados Unidos. Portanto, algo não bate. As contas, nem pensar!

No entanto, a classe política insiste em acusar servidores públicos de carreira como os grandes vilões, apresentando propostas esdrúxulas que protegem suas regalias e prejudicam os verdadeiros representantes do Estado, que são aqueles que estão ali para defenderem os interesses do Estado, pois foram escolhidos por concurso público de provas e títulos e não estão ali por serem “amigos” de políticos.

Apesar de se autodenominarem protetores do Estado, e principalmente responsáveis pelos gastos públicos de forma eficiente, a classe política nacional não apresenta quaisquer projetos que delimitam seus gastos, que diminuem suas cotas ou seus benefícios. Não apresentam projetos que visam o enxugamento da máquina pública, começando pelos cargos comissionados de livre nomeação deles próprios. E principalmente não apresentam projetos que dificultam a corrupção, criando leis severas contra aqueles que cometerem tal crime.

Nos últimos anos, o Estado foi vítima constante de esquemas que defraudaram seu patrimônio de forma sistêmica causando prejuízos incalculáveis. Escândalos como o Mensalão do PT, Mensalão do DEM, Mensalão do PSDB, a máfia da merenda, escândalo da Petrobras (Lava Jato), Banestado, Máfia dos Sanguessugas, dentre outros. Há de se ressaltar que, até neste período de pandemia, onde a classe política e o Estado deveriam trabalhar juntos em prol da sociedade e do bem público, várias suspeitas de corrupção estão sendo levantadas e investigadas em vários estados e no Ministério da Saúde.

Por isso, não dá para acreditar na boa vontade daqueles que, para se protegerem e protegerem aos seus, acusam os verdadeiros protetores do Estado de serem os grandes vilões nas contas públicas. Principalmente quando alegam que uma das grandes causas da ineficiência do Estado é a estabilidade do funcionário público concursado. Aí vemos que não há qualquer boa intenção partindo da classe política.

Se analisarmos a maioria dos casos de corrupção do país, casos estes que a classe política não faz nada para combater, a maioria dos casos envolvem entes políticos e seus apadrinhados, em sua maioria, funcionários públicos indicados em cargos comissionados de livre nomeação - funcionários estes que claramente trabalharam em prol do seu partido ou seu político, ou grupos de políticos, e nunca, a serviço do Estado - portanto, o aumento deste tipo de servidores, sem qualquer compromisso com o serviço público e o Estado propriamente dito, vai aumentar a influência política dentro dos órgãos públicos transformando os serviços públicos em secretarias de partidos ou políticos, facilitando ainda mais a corrupção dentro destes órgãos.

Por isso, ao analisarmos a reforma administrativa tão proclamada aos quatro ventos como um marco para a transformação do Estado, note-se que tal nada mais é que uma maneira que os políticos encontraram de, além de manter suas regalias, bem como as de algumas outras classes mais abastadas - como militares, magistrados, ministros de estado dentre outros poucos - aparelharem os estados com apadrinhados políticos e pessoas que se sujeitam a trabalhar a serviço destes e não a serviço do Estado.

Ao analisarmos a reforma administrativa, notamos claramente que a última coisa que nossos políticos se preocupam são com as contas públicas ou com os serviços prestados para a população em geral. O que eles querem, de fato, é aumentar seus poderes dentro dos órgãos, a fim de utilizarem a máquina pública ao seu bel prazer em detrimento de quem mais precisa, que é o povo brasileiro.

Marc Souza é policial penal, escritor e diretor do SIFUSPESP