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Reforço da entidade de classe na ação civil pública que pede nulidade do edital demonstra que pretensão do governo Doria de conceder CDPs a empresas esbarra em série de inconstitucionalidades, entre elas o não respeito à criação da Polícia Penal

por Giovanni Giocondo

A Seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil(OAB) solicitou no último dia 6 de agosto à Justiça a entrada como amigo da Côrte(amicus curiae) na ação impetrada pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo e por outras entidades, entre elas o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais(IBCCRIM), contra a privatização dos Centros de Detenção Provisória(CDPs) de Aguaí, Gália I e II e Registro.

A ação civil pública pede a nulidade do edital que concede a gestão dessas unidades a empresas. O edital está suspenso temporariamente desde 26 de maio em virtude da pandemia do coronavírus, mas pode ser retomada pela Secretaria de Administração Penitenciária(SAP) a qualquer momento.

A ação, proposta junto à Promotoria de Justiça de Direitos Humanos do Ministério Público Estadual(MP-SP), alega que há inconstitucionalidade na concessão a terceiros das atividades executadas por servidores públicos dos quadros da SAP, que são típicas de Estado e relativas ao poder de polícia, e portanto indelegáveis à iniciativa privada.

“Em especial o controle, a segurança e disciplina, avaliações técnicas e periciais que mantenham relação direta com a imposição de restrição de liberdade da pessoa em situação de encarceramento no interior das unidades prisionais”, explica o documento encaminhado pela OAB para reforçar o entendimento de que tecnicamente, valendo-se do direito, essas atividades policiais são exclusivas do Estado.

Como forma de legitimar a sua admissão na ação civil pública, a Ordem também esclarece que diante da relevância da matéria, e de acordo com o que determinam o Código de Processo Civil e a Lei 9.868/99, o uso do recurso de amicus curiae em ações que visam a atender os interesses de uma coletividade colabora “para maior participação social na definição e no alcance das normas constitucionais, bem como na declaração de inconstitucionalidade das leis”.

Com base no Decreto 9.507/18, que regulamenta a execução indireta por meio de contratos pela administração pública federal, a OAB reitera que é vedada a execução indireta de serviços que estejam relacionados ao poder de polícia do Estado”, além da aplicação de sanção, assim como também não podem ser terceirizados “serviços que sejam inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou da entidade”.

Ainda de acordo com a Ordem dos Advogados do Brasil, a legislação estadual também impede que o poder de polícia seja terceirizado. A lei complementar 959/2004, que reestruturou a carreira dos agentes de segurança penitenciária(ASPs) mostra por exemplo que a custódia de sentenciados deve ser feita exclusivamente por funcionário público.

Apesar de haver leis estaduais que criaram dispositivos permitindo a terceirização de obras e serviços, fica claro para a OAB que “há diferenças conceituais entre o que é o regime de delegação contratual de execução indireta de obras e serviços e quais são os serviços próprios do Estado, indelegáveis”, pondera o documento.

A privatização também é inconstitucional para a Ordem porque o artigo 144 da Constituição Federal, que explica que a segurança pública será exercida pelas polícias - inclusive a penal - e o artigo 37 da mesma Carta Magna, define que o poder de polícia será prerrogativa exclusiva de funcionários públicos.

“Toda a atividade de vigilância, fiscalização e custódia da pessoa em privação de liberdade deve ser realizada por quem detém poder de polícia. Atividades como liberação e tranca de celas, fiscalização dos custodiados, revista, utilização de meios para controle de motins, movimentação e transportes de presos, manutenção da segurança e disciplina devem ser exercidas por servidores de carreira”, reitera o pedido.

A OAB ainda se atenta para o fato de que o edital de privatização também incorre em inconstitucionalidades ao definir que caberá à empresa contratada responder por atividades como “controle interno e de revista”, “manutenção da ordem e apoio à segurança e à disciplina”, ‘o monitoramento da movimentação dos presos’ e o apoio “à prevenção de tumultos”. São novamente, funções com poder de polícia e logo, exclusivas dos policiais penais.

Ainda no documento, a Ordem dos Advogados do Brasil apresenta o edital com informações claras sobre a utilização de mão de obra de servidores públicos somente nos cargos de direção e no trabalho de vigilância externa e escolta, em demonstração clara de nova afronta constitucional.

Finalmente, a Lei de Execuções Penais(LEP) define em seu artigo 83-A que apenas as atividades meio do sistema prisional podem ser terceirizadas, entre elas a hotelaria, lavanderia, manutenção dos prédios, informática e conservação, bem como a execução de trabalho pelo preso, sempre supervisionadas pelo Estado. Por outro lado, o artigo 83-B veta a privatização “de atividades que exijam o exercício do poder de polícia”.

A privatização dos CDPs de Gália I e II, Registro e Aguaí, bem como qualquer outra unidade prisional paulista, também desrespeita a Lei Federal de 2004 e a Lei Estadual do mesmo ano que disciplinam as parcerias público-privadas; as regras mínimas das Nações Unidas para o tratamento de presos - aliás adicionadas à Constituição Estadual de São Paulo que em seu artigo 143 versam o seguinte:

“A legislação penitenciária estadual assegurará o respeito às regras mínimas da Organização das Nações Unidas para o tratamento de reclusos, a defesa técnica nas infrações disciplinares e definirá a composição e competência do Conselho Estadual de Política Penitenciária”.

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