Presídios de SP só têm 1/3 dos profissionais de saúde
Em 10 anos governo constrói 30 presídios, mas número de servidores cai e não há reposição
Com a inauguração do Centro de Detenção Provisória de Aguaí, em agosto, o Governo de São Paulo completou a construção de 30 presídios entre 2013 e 2023 com uma redução no efetivo de servidores. O quadro total de Agentes de Segurança Penitenciária (ASP) é de 28.254, número que jamais foi atingido. Em 2013, o Estado tinha 24.652 ASPs. Atualmente, o número é de 21.513, deficit de 23,8%. Entre os Agentes de Escolta e Vigilância Penitenciária (AEVPS), a defasagem chega a 21,3%. E, entre os servidores administrativos, 58,48%.
A situação mais dramática é no quadro dos profissionais de saúde: são 1.384 servidores para tratar uma população de mais de 196 mil presos divididos em 182 unidades espalhadas pelo estado. Mais de 2.500 postos estão vagos e o deficit chega a 64,69%. Hoje, cada profissional de saúde da ativa faz o serviço de três. “Não é à toa que o Mecanismo Nacional de Combate à Tortura (MNPCT) encontrou diversas violações aos direitos humanos nas penitenciárias vistoriadas. Faltam profissionais para prestar atendimento médico, a qualidade da comida servida a presos e servidores é sofrível; as condições de higiene são péssimas e nas unidades superlotadas falta água. Esse sucateamento transforma o sistema em uma bomba-relógio prestes a explodir”, denuncia Fábio Jabá, presidente do Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional de São Paulo (SIFUSPESP).
Uma das consequências desse sucateamento é o afrouxamento da segurança nas unidades, já que agentes que deveriam garantir a ordem são remanejados para suprir a falta dos demais profissionais, principalmente os do setor administrativo. “Aqui em SP a situação está caótica e tende a piorar depois que o governo estadual retirou R$ 27 milhões da Secretaria de Administração Penitenciária para destinar à CPTM”, afirma Jabá.
Sem água e remédios
A situação do CDP IV de Pinheiros, denunciada pelo sindicato recentemente, é o retrato do caos no sistema. Além da defasagem de servidores, falta água, luz, kits de higiene, medicamentos e atendimento médico. O local é um presídio de trânsito, que abriga detentos levados a São Paulo para tratamento médico. Tem capacidade para 566 pessoas, mas abrigava 813 em 7 de novembro. “Os presos chegam doentes, feridos e não há servidores de saúde para prestar esse atendimento de forma adequada. Muitas vezes o policial penal tem que socorrer e tentar remediar a situação, mas é um tratamento desumano que não atinge apenas o preso”, comenta Jabá.
As péssimas condições de saúde, higiene e alimentação elevam a tensão no sistema e provocam motins e reações violentas contra os agentes de segurança. “É uma situação de insegurança generalizada. Somente esse ano ocorreram, pelo menos, 12 motins e 20 agressões a servidores penitenciários. O sistema prisional está à beira do colapso e o preço é pago por toda a sociedade. Quando a insegurança explode dentro de um presídio, o crime organizado se vinga por meio de seus braços aqui fora. Quem paga o preço é a população”, diz Jabá.
Baixas diárias
Segundo dados do próprio governo, 1886 servidores do sistema prisional se aposentaram em 2022, uma média de 5 por dia. “Sem qualquer previsão de concursos públicos, sabemos que esse problema será agravado em 2024 porque todos os anos perdemos servidores e não há reposição”, reclama Jabá.
Insegurança
Segundo resolução de 2009 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, a proporção mínima aceitável é de um agente para cada grupo de cinco presos. Em 2013, a proporção era de 1 para 8,5. Hoje, cada servidor cuida de um grupo de 9 presos. “Isso é uma média sem levar em conta as escalas de serviço. É comum recebermos denúncias de que unidades com mais de mil presos estão sendo cuidadas por dois ou três agentes em determinados plantões”, revela.
A situação ganha contornos dramáticos se consideramos que esse contingente de servidores é dividido em quatro turnos distintos nas unidades. Levantamento feito pelo sindicato com base nos dados do Diário Oficial mostra que, até abril de 2023, 1.181 agentes deixaram o serviço público por aposentadoria, morte ou exoneração. “Se a gente considerar que, além dessas baixas, temos, em média, 10% do efetivo afastado por problemas de saúde, a proporção chega a um servidor para cada 12 presos. Isso torna o ambiente de trabalho cada vez mais massacrante e perigoso”, comenta Jabá.
1 agente para 17 presos
O sindicalista cita o exemplo da Penitenciária 1 de Mirandópolis, que tem em média 110 agentes divididos em quatro turnos para cuidar de 1.873 presos, o que equivale a 1 agente para cada 17 presos. “Não há como garantir a segurança do sistema com uma defasagem tão alta. Hoje o crime organizado tem conexões em tempo real. Uma rebelião em presídio pode provocar uma reação em cadeia que vai abalar toda a segurança pública do Estado. Nós já vimos isso acontecer antes, não queremos ver de novo”, completa.